quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

A leitura muito além dos livros

http://www.camposebravo.com.br/noticias.asp?cod=3446

A leitura muito além dos livros 

É comum ouvir as pessoas se lamentarem de que os jovens encontram-se envolvidos apenas com o universo cibernético, mas não seduzidos por livros. Pergunta-se: qual é o papel familiar nesse processo? E a resposta está longe de ver a família como coadjuvante nessa história. Faz-se necessária a contribuição efetiva da família para que haja um incentivo, um lugar construído para a leitura, e assim não delegue essa responsabilidade apenas para a escola. Primeiramente, deve-se enfatizar que o processo da leitura não acontece somente no contato com um livro, revista ou jornal. A leitura precisa ser compreendida também como uma leitura de mundo. Sendo assim, o trabalho de interpretação, de construção de significados será mais rico e produtivo se exercitado em diversos momentos e esse processo é uma construção conjunta, que não se restringe à escola. 

Ler não é apenas decodificar: é também decodificar. A polissemia desse verbo está presente em diversos campos do conhecimento, que vão desde a ciência e tecnologia até a filosofia, música, as artes, a literatura. O leitor participa de um jogo, muitas vezes sedutor, em que a resposta única não existe, existe a resposta possível em face de inúmeras leituras, a resposta aceitável diante de uma argumentação coerente. O leitor preenche as lacunas deixadas no texto, com suas referências múltiplas, evocadas por signos textuais e acionadas por um coautor, através de seus recursos cognitivos. Nessa perspectiva, a leitura instiga a pensar de forma articulada e caminha para um exercício de interpretação, que está além do código linguístico. É um processo interativo em que é imprescindível o conhecimento prévio, no sentido linguístico, textual, mas também a leitura de mundo. A bagagem trazida no ato da leitura faz com que o exercício passe da superficialidade e torne-se enriquecedor. Na obra O ato da leitura, Wolfang Iser trabalha o processo da leitura como a interação dinâmica entre texto e leitor e ressalta que o não dito estimula os códigos, os atos de constituição de sentido, incentivando o leitor a ocupar os vazios do texto com suas projeções. 

A leitura passa pelo envolvimento, pela decodificação de símbolos, pelo prazer e, consequentemente, pela construção de significados. Roland Barthes via o texto como prazer e nesse universo caberia falar de emoção, de fruição, de expressões ambíguas como prazer do texto e texto de prazer: " Haveria uma mística do texto – Todo o esforço consiste, ao contrário, em materializar o prazer do texto, em fazer do texto um objeto de prazer como os outros.” O prazer, cujo significado associa-se a contentamento, alegria, boa vontade, agrado, distração e divertimento, requer algo que transcende a simples teoria, e que seja efetivamente vivido. Sabe-se: melhor que a teoria é o aprendizado pelo exemplo, que produz um efeito ainda mais real. Nesse sentido, a escola não pode estar solitária: há o papel solidário e imprescindível da família, que abrirá espaços para que os momentos de leitura se façam presentes no dia a dia. As experiências compartilhadas, as leituras feitas em diversos níveis, que não se restringem apenas aos livros, mas se estendem a filmes, propagandas e músicas podem ser instrumentos para que o mundo seja percebido sob uma perspectiva enriquecedora de relacionar a ficção à realidade. 

O diálogo estabelecido entre texto e leitor suscita a ideia de que o texto é um elemento vivo, uma materialidade de significantes que o autor articulou. Contudo, só toma corpo com o olhar do outro. O leitor, sob a ótica de suas experiências, conduz a leitura de forma mais prazerosa, ou não. Assim, a leitura passa por caminhos descontínuos, onde quem lê aciona seus links intertextuais. Mudar o perfil de uma sociedade letrada, mas que não vê a leitura como prazer, como diversão, é mudar um universo culturalmente construído em que ler é sinônimo de imposição, de obrigação e de necessidade. A leitura deve deixar seu lugar estratégico de busca de conhecimento para se transformar em deleite. Descobrir que algo, até então visto como objeto de punição, pode ser prazeroso, instigante e desafiador é se ver diante de um tipo de texto que se casa com seus desejos ou que, mesmo indo de encontro aos seus pensamentos, é reflexivo e promove o crescimento. Tornar-se leitor autônomo, questionador e, portanto, coautor de um texto, é o primeiro passo para entender que a leitura está além dos livros e que um texto só ganha vida quando alguém imprime suas inferências, contribuindo para que as palavras deixem de ser apenas um signo linguístico. Quando alguém relaciona a realidade ficcional com a realidade em que se vive.

*Professora de língua portuguesa, literatura e redação, formada pela UFMG e pós-graduada em estudos linguísticos pela UNI-BH

http://www.em.com.br/



Fonte: Estado de Minas - Alessandra Aparecida Souza Lima Marques*

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Marcos Bagno defende em livro a ' gramática do português brasileiro '

http://carosamigos.terra.com.br/index2/index.php/noticias/2494-linguista-marcos-bagno-defende-em-livro-a-gramatica-do-portugues-brasileiro


Da Redação
gramatica-capa-iEm "Gramática Pedagógica do Português Brasileiro", o pesquisador em linguística Marcos Bagno compila o que os leitores de Caros Amigos conhecem de seu trabalho através da coluna que mantém na revista. Bagno defende a libertação da língua praticada no Brasil das regras seculares do português de Portugal e uma gramática que contemple os modos do falar brasileiro.
O livro, publicado pela editora Parábola, já está nas livrarias. Na entrevista abaixo, elaborada pela educadora Solange Americano, formada em letras pela USP e que atua no programa Educação de Jovens e Adultos (EJA), Bagno descreve um pouco o que está na obra.

Caros Amigos - O livro derruba  o  mito de que falamos todos a mesma língua no Brasil esclarecendo que monolinguismo e homogeneidade linguística são bem diferentes. O que  caracteriza o português brasileiro contemporâneo?
Marcos Bagno: O português brasileiro contemporâneo é como qualquer outra língua viva contemporânea: uma língua em constante mutação, instável, sempre em processo de se fazer e refazer. Toda e qualquer língua viva é sempre uma língua que “está”, nunca uma língua que “é”, porque nós falantes não paramos de modificar nossas línguas o tempo todo. Num país gigantesco como o nosso, com situações sociais tão diversificadas, climas, etnias, economias diferentes etc., a língua também é diversificada, heterogênea, variável e mutante.
CA - O que deve vir primeiro: o estudo da língua ou o domínio da escrita e leitura?
MB - Sem dúvida nenhuma, o domínio da leitura e da escrita, ou seja, o letramento. Saber ler e escrever com competência e criatividade é o conhecimento mais importante para a plena conquista da cidadania numa sociedade republicana e democrática. O estudo da língua, o estudo específico e técnico da língua, deve ser deixado para depois que a pessoa tiver um bom grau de letramento. Além disso, no processo de aprendizagem da leitura e da escrita é inevitável que a pessoa estude também o funcionamento da língua, reflita sobre ele, intua as regras. Mas isso pode ser feito sem análise sintática e sem decoreba de nomenclatura.
CA - O que seria uma política linguística para o Brasil?
MB - Seria uma política com dois focos, um para o interior e outro para o exterior. Para o interior do Brasil, ela deveria contemplar o ensino do português brasileiro urbano de prestígio, contemporâneo, tal como ele já vem sendo descrito pela pesquisa linguística brasileira nos últimos quarenta anos. É perfeitamente possível, hoje, elaborar material didático de boa qualidade usando o que já sabemos, e sabemos muito, da gramática real do português brasileiro. Temos de produzir, portanto, dicionários e gramáticas afinados com essa realidade do português brasileiro, reconhecendo o português brasileiro como uma língua independente do português europeu, com sua própria história e sua própria gramática e seu próprio léxico.
Ainda no plano interno, é preciso reconhecer o Brasil com uma das nações com maior multiplicidade linguística de todo o mundo: temos quase 200 línguas diferentes faladas em nosso território, mas durante toda a história fomos iludidos com o mito do monolinguismo, que justificava inclusive o extermínio dos povos falantes de línguas indígenas. Reconhecer as línguas como patrimônio cultural, simbólico e identitário de milhões de pessoas significa permitir que elas falem suas línguas, aprendam a ler e a escrever nelas, possam divulgar essas línguas por meio impresso, audiovisual, informatizado etc. É uma questão de direito, o direito linguístico.
No plano externo, o Brasil precisaria assumir o que ele de fato é, a nação mais importante de língua portuguesa, e empreender uma divulgação agressiva da nossa língua, por meio de leitorados no exterior, produção de material didático para o ensino do português brasileiro a estrangeiros etc. Nossa política linguística ainda é muito subserviente às decisões dos portugueses, que são minoritários em quantidade de falantes.
CA - Essa nova abordagem da língua, o português brasileiro, auxiliaria na crise da educação no Brasil?
MB - Não seria a única solução, mas certamente colaboraria muito para melhorar a qualidade do que se ensina e se aprende. Se nas escolas pararmos de ensinar regras que não fazem parte da gramática do português brasileiro, se pararmos de tentar convencer os alunos de coisas que não fazem nenhum sentido (como a concordância maluca de “vendem-se ovos”), se deixarmos de querer ensinar um estado de língua de 350 anos atrás (“vós poderíeis”), se nos preocuparmos mais com a leitura e com a escrita e menos com a obsessão classificatória... assim talvez possamos começar a destruir a antipatia secular que a escola implantou nas pessoas com relação ao estudo da língua.Marcosbagno
CA - Como a linguagem popular pode influenciar a versão culta do português falado no Brasil? Quais as influências no léxico, na construção sintática e modos de dizer?
MB - Já podemos começar questionando: o que é “linguagem popular”? O que é uma “versão culta” da língua? As antigas divisões muito rígidas entre “língua popular” e “língua culta” já perderam todo o sentido na sociedade brasileira contemporânea. A mobilidade social intensa, que cresceu ainda mais na última década graças aos programas de inclusão social que fizeram surgir a chamada “nova classe média”, tornou essas fronteiras muito mais instáveis, líquidas ou simplesmente acabou com elas. Hoje são mínimas as diferenças linguísticas entre a fala de um cidadão de classe alta e a de um cidadão de classe baixa. Além disso, as pesquisas mostram que os chamados “erros” cometidos na “linguagem popular” também ocorrem na “língua culta”, só que na boca dos privilegiados eles aparecem como “lapsos” ou “licenças”. O rico não erra, comete lapsos. O pobre não, erra feio. Essas diferenças de avaliação social são muito mais fundas e sérias do que as diferenças propriamente linguísticas.
CA - No livro você diz que a mudança linguística é inevitável e é impulsionada pelos próprios falantes.  As variantes linguísticas populares tão estigmatizadas, hoje, como “menas coisas”, podem vir a ser futuramente gramaticalizadas e dicionarizadas?
MB - Perfeitamente. Costumo dar como exemplo o caso do particípio passado do verbo “pegar”. No dicionário Caldas Aulete, da década de 1950, a forma “pego” era atribuída a “pessoas ignorantes”. Hoje os dicionários registram a forma “pego” sem nenhum comentário, porque o uso acabou impondo a forma nova. E é assim que acontece desde sempre. Se hoje falamos português brasileiro e não latim, é porque, ao longo dos séculos, os falantes foram transformando a língua em todos os seus aspectos até ela ficar tão diferente do que era antes a ponto de receber outro nome. O português brasileiro é a continuação histórica do latim, algo como um “latim falado errado”, para usar a terminologia do senso comum...
CA - “Os linguistas têm se limitado a descrever as relações entre língua e sociedade: trata-se agora de transformá-las.” Como seria essa transformação?
MB - Os linguistas têm acumulado muito conhecimento sobre as línguas, mas muitas vezes não se dão conta de que esse conhecimento tem o poder de destruir velhos mitos culturais, desmentir preconceitos sociais e colaborar para uma efetiva democratização das relações sociolinguísticas. Podemos transformar essas relações levando a um público cada vez mais amplo as nossas descobertas, mostrando como é a língua de fato e não a língua idealizada das gramáticas normativas e do ensino tradicional. É o que tento fazer com a minha Gramática.
CA - Qual a verdadeira dimensão da gramática e a sua importância para o conhecimento da língua?
MB - O termo “gramática” encobre muitos sentidos diferentes. Para o linguista, “gramática” é o nome que se aplica a todas as regras que fazem uma língua funcionar. Assim, faz parte da gramática do português brasileiro a regra que nos leva a dizer coisas como “ainda não chegou os livros que eu pedi” ou “os menino tá tudo lá fora brincando”, junto com “ainda não chegaram os livros” ou “os meninos estão todos lá fora brincando”, porque todas essas construções seguem regras, não são frutos do acaso ou da “burrice” dos falantes. No entanto, por razões históricas e socioculturais, nem todas as regras de funcionamento da língua recebem a mesma avaliação social: algumas são tidas como “boas” e “bonitas”, enquanto outras são tidas como “ruins” ou “feias”. Essas avaliações são exclusivamente ideológicas, nada têm que ver com fenômenos propriamente linguísticos. Mas são essas regras seletivas e selecionadas que entram na descrição dos livros chamados “gramáticas”, que são tradicionalmente obras normativas, prescritivas, ou seja, que deixam de lado muita coisa que existe na língua para só incorporar o que uma certa tradição considera correto.
CA - Normalmente o professor de língua portuguesa ensina a norma padrão, pois o aluno vai à escola para aprender uma variedade de língua que ele desconhece. As outras variantes são apresentadas como algo exótico e pitoresco. Na realidade o professor  está ensinando a hegemonia do padrão culto da língua e a desqualificação e repressão do padrão popular.
MB - A coisa é mais complexa do que isso, porque hoje em dia nosso professorado provém majoritariamente das camadas sociais C, D e E. Grande parte dos que se formam docentes vêm de famílias com pais e mães pouco letrados ou mesmo analfabetos. Nossos docentes hoje são muito mais portadores das “normas populares” do que os de antigamente. Assim, é pouca a diferença entre o que fala um(a) professor(a) e o que fala um(a) aluno(a). Na escola, hoje, convivem sem problemas as muitas variedades do português. Com isso, a norma-padrão tradicional, que sempre foi muito artificial e anacrônica, perde totalmente o seu sentido na escola de hoje. Por isso, muitos docentes ficam espantados ao descobrir que determinadas construções que eles mesmos usam são consideradas “erradas” pela tradição. Assim, o mais importante, na formação docente, é antes de tudo o letramento desses mesmos docentes, que não têm bom domínio da leitura e da escrita porque vêm de ambientes sociais e culturais onde a leitura e a escrita não têm um peso significativo. Aí está o grande nó: como querer desenvolver o letramento dos alunos se os próprios professores não têm um letramento suficiente? Enquanto esse nó não for desfeito, dificilmente levaremos a educação a melhores patamares.
CA - Norma-padrão (culta ideal) e norma culta real (mais próxima da realidade do falante) podem conviver ou são excludentes?
MB - Não só podem como convivem. A atividade linguística de um povo independe das prescrições, das determinações de meia dúzia de supostos dirigentes dos assuntos linguísticos. A língua é parte integrante do próprio ser de cada indivíduo: nós somos a língua que falamos e ela nos constitui como seres sociais. Todo indivíduo falante é portador de uma ampla intuição linguística e de um repertório linguístico poderoso. A função da escola é ampliar ainda mais esse repertório, levando a pessoa a conhecer outros usos, sobretudo os que não fazem parte de sua vivência sociocultural. Daí a importância da leitura e da leitura de textos literários, da literatura consagrada, porque são atividades ausentes do ambiente familiar da grande maioria dos nossos aprendizes. Conforme já disse, as fronteiras entre as variedades linguísticas são cada vez mais fluidas, há uma forte e intensa mixagem de normas e variantes hoje no Brasil.
CA - O livro é destinado aos professores de língua portuguesa, o próximo passo seria construir a didática da gramática do português brasileiro? Como traduzir essa teoria para os alunos do ensino básico?
MB - Essa teoria não tem que ser traduzida para os alunos do ensino básico. Os alunos do ensino básico têm que aprender a ler, a reler, a re-reler, a escrever, a reescrever, a re-reescrever etc. Nesse processo de letramento eles vão se apoderando, intuitivamente, da gramática (do funcionamento) da língua. O professorado, no entanto, tem de conhecer muito bem, muito profundamente, com profundidade teórica e científica, o seu objeto de trabalho, não para “ensinar gramática”, para saber reconhecer os fenômenos linguísticos que vão surgindo em sua prática pedagógica.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

O computador pode substituir o professor?

http://educarparacrescer.abril.com.br/blog/isto-da-certo/2012/02/08/o-computador-pode-substituir-o-professor/


“Se existe um professor que pode ser substituído por uma máquina, é porque ele realmente merece ser substituído”. A resposta foi uma provocação do indiano Sugata Mitra, professor de Tecnologia Educacional da Newcastle University, na Inglaterra e professor visitante do Massachusetts Institute of Technology, o famoso MIT.
Em palestra ontem no EducaParty, programação voltada para a Educação na Campus Party, ele relatou as pesquisas que comprovaram a habilidade das crianças em aprender sozinhas quando têm acesso a um computador com internet, dispensando a intermediação de um adulto.

O professor indiano Sugata Mitra é um dos maiores pesquisadores na área de tecnologia e Educação. Foto: Douglas Eiji Matsunaga
Seu mais emblemático experimento é o “Hole in the Wall” (Buraco na Parede, em tradução livre). Sugata Mitra colocou um computador com acesso à internet no muro de uma favela em Nova Delhi, na Índia e, com auxílio de câmeras, observou o processo durante dois meses. O resultado? Crianças que nunca viram um computador e não sabiam inglês aprenderam rapidamente a navegar na internet e ainda ensinavam outras crianças. “Em 9 meses, as crianças atingem o nível de secretárias que trabalham com o computador no escritório”, disse Mitra.
Essa experiência pode ser uma solução para um dos problemas que Mitra encontra na Educação atualmente: a falta de escolas. “Ela demonstra que crianças expostas ao computador rapidamente entendem seu funcionamento” e os benefícios não tardam a aparecer: melhora a leitura, a compreensão e a capacidade de responder a perguntas. Porém, a principal transformação que esse aprendizado realiza nas crianças é outra. Elas ficam mais confiantes, a autoestima cresce, a postura muda. “Elas dizem para si mesmas que são capazes de fazer o que as outras crianças fazem, mesmo que não tenham a mesma condição financeira”, relata Mitra.
Falta de interesse
O segundo problema diagnosticado por ele é o desinteresse dos alunos. A solução é simples: saber instigar as crianças com a ajuda do computador. Hoje, a principal reclamação dos alunos é não entender por que estão aprendendo determinada matéria. “Trigonometria, por exemplo, é uma palavra que apavora todo mundo”, exemplifica.
Uma história real mostra como despertar o interesse das crianças. Em Hong Kong, Mitra perguntou aos alunos como um Ipad sabe sua localização e deixou que pesquisassem na internet. Trinta minutos depois, os alunos aprenderam que três satélites estavam envolvidos no trabalho. E, depois de outra rápida pesquisa, descobriram que o Ipad usava trigonometria. “Perguntei se eles queriam saber como isso funcionava e os meninos de 12 anos responderam que sim! E então eu disse ao professor de matemática: “agora a porta está aberta””.
O modelo atual de Educação, que ignora as mudanças promovidas pela tecnologia, também contribui para o desinteresse dos alunos, acredita Mitra. “Uma criança lê uma página inteira, mas não consegue entendê-la, interpretá-la”, aponta. Para ele, isso é fruto de um modelo ultrapassado de Educação “definido 300 anos atrás”, que prioriza a capacidade de decorar informações. Naquela época isso fazia sentido, já que o cérebro era a principal ferramenta para armazenar dados; mas hoje existem diversos dispositivos que podem realizar essa tarefa. “A memória não é o mais importante, mas sim, a capacidade de compreensão e de discernimento sobre as informações que lê”, defende. O sistema educacional ainda não entende isso: “se um aluno perguntar se pode levar um pendrive para fazer a prova, a resposta será não.”
Voltando à polêmica sobre a necessidade de um adulto que intermedeie o processo de aprendizagem, Mitra explica que o papel do professor assim como o currículo devem ser reformulados para que as crianças se interessem pelo estudo. Hoje, o professor ensina um método para solucionar problemas e explica quando usá-lo. Para ele, as crianças devem ter a possibilidade de encontrar um método sozinhas e o professor deve apoiar e instigar esse processo.
Assista a uma palestra que Sugata Mitra o evento Ted Global, em 2010, sobre suas pesquisas.
http://www.ted.com/talks/sugata_mitra_the_child_driven_education.html

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

O que dizer? É Brasil .

http://educacao.uol.com.br/noticias/2012/02/17/salario-de-professor-e-operador-de-escavadeira-em-edital-do-mt-causa-polemica-no-facebook.htm



Salário de professor e operador de escavadeira em edital do MT causa polêmica no Facebook.

  • Reprodução
    Montagem feita com o edital do concurso público da prefeitura de Vila Rica (MT) e publicada no Facebook
    Montagem feita com o edital do concurso público da prefeitura de Vila Rica (MT) e publicada no Facebook
A comparação entre os salários oferecidos em um concurso público da prefeitura de Vila Rica, no Mato Grosso, para professores e operadores de máquinas teve repercussão negativa nas redes sociais. Enquanto a remuneração inicial oferecida para um operador de escavadeira hidráulica, com ensino fundamental incompleto, é de R$ 1.291,98, o salário para um professor com ensino superior é de R$ 1.246,32.

A jornada de trabalho dos professores aprovados no concurso será de 30 horas semanais, já os operadores de máquina trabalharão 40 horas semanais.

Um perfil do Facebook divulgou uma montagem com a imagem do edital e, até o momento da publicação dessa matéria, a foto foi compartilhada por mais de 3 mil pessoas. Um dos usuários da rede social comentou: “É necessário uma mudança e valorização do ensino, assim como ampliar a possibilidade para todos terem acesso à qualificação, tanto profissional como acesso ao ensino publico superior de qualidade”.

Outros internautas se perguntam “se essa situação é possível”, enquanto alguns afirmam que “isso é Brasil”.
O piso salarial nacional dos professores é de R$ 1.187 para 40 horas semanais e vale para todos os docentes que atuem da educação infantil ao ensino médio. A CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação) reivindica para esse ano um piso de R$ 1.937,26.
A reportagem do UOL entrou em contato com a prefeitura de Vila Rica e aguarda retorno, pois, segundo a atendente, o responsável só poderá falar no período da tarde.

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Campo tem analfabetismo em 23% e mais de 37 mil escolas fechadas Leia mais sobre esse assunto em http://oglobo.globo.com/educacao/campo-tem-analfabetismo-em-23-mais-de-37-mil-escolas-fechadas-3079377#ixzz1maJEEs8n © 1996 - 2012. Todos direitos reservados a Infoglobo Comunicação e Participações S.A. Este material não pode ser publicado, transmitido por broadcast, reescrito ou redistribuído sem autorização.

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Campo tem analfabetismo em 23% e mais de 37 mil escolas fechadas


ESCADA (PE) e RIO - "Vai reformar?"; "Quando é que as aulas começam?"; "Vai ter 6 série?", pergunta, quase sem pausa, Heronildo José de Araújo, 11 anos, confundindo a equipe de reportagem com autoridades da prefeitura de Escada, município a 62 quilômetros da capital pernambucana. Ele vive em uma casa no Engenho Canto Escuro, em frente à Escola Municipal Tiradentes, um dos 37.776 estabelecimentos de ensino rurais do país que fecharam as portas nos últimos dez anos, segundo dados do Censo Escolar do Ministério da Educação (MEC).
- Não gosto de viajar todos os dias para tão longe - reclama o menino, que sente enjoo no sacolejo do ônibus escolar e tem dois irmãos que também estudam muito distante de casa.
O número de escolas fechadas impressiona, mas está longe de ser o único dado que chama atenção na educação do campo, onde existem cerca de 80 mil estabelecimentos de ensino. Entre a população de 15 anos ou mais, a taxa de analfabetismo na zona rural chega a 23,3%, três vezes maior do que em áreas urbanas, e a escolaridade média é de 4,5 anos, contra 7,8 anos, mostra estudo de 2009 da socióloga Mônica Molina e mais dois especialistas para o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República.
- A ausência do Estado na garantia do direito à educação se traduz na precariedade da oferta. As alterações ocorridas nos últimos dez anos foram pequenas. Os professores são mal formados, não há infraestrutura e nem material pedagógico - avalia Mônica, professora da Universidade de Brasília (UnB).
Segundo ela, o fechamento das escolas, em geral, resulta de expansão do agronegócio e da nucleação - quando escolas de menor porte são extintas e os alunos, transferidos para unidades mais distantes e maiores. Mônica observa ainda que as diretrizes do setor dizem que a nucleação deve ser feita após os cinco anos iniciais do ensino fundamental e, preferencialmente, em escolas situadas também no campo, e não na área urbana.
Na opinião de Mônica, as políticas públicas para o campo precisam não só vincular o desenvolvimento à educação, mas garantir outros direitos:
- Ter acesso à terra é a primeira condição para o cidadão permanecer onde está e levar os filhos para a escola. O que está causando o fechamento das escolas não é só a nucleação. As áreas rurais estão sendo engolidas pela concentração fundiária. E os pais enfrentam de tudo para as crianças estudarem.
Que o diga José dos Santos, que foi morar na periferia de Escada para garantir o estudo dos filhos. Com o fechamento da Tiradentes, este ano, os dois filhos ficaram quatro meses sem aula.
- A escola era pequena, mas servia à comunidade. Tinha 14 alunos. Era pobre, não tinha luxo, mas fechar é muita perda - lamenta a mulher de José, Edna, que, assim como o marido, estudou somente até a 4 série e deseja bem mais para os filhos.
Com pós-doutorado em Educação, Eliane Dayse Furtado, da Universidade Federal do Ceará (UFC), também considera que a nucleação está por trás de boa parte do fechamento das escolas. Foi o que constatou ao percorrer 14 estados das cinco regiões do país em projetos de formação de educadores rurais. Na ocasião, também ouviu reclamações sobre precariedade do transporte escolar.
- Outro dia, em Redenção (CE), as crianças ficaram três semanas sem aula porque o único ônibus quebrou. E, quando chove, ele não passa - conta ela.
Professora da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Sonia de Jesus observa que, apesar dos problemas que comprometem a qualidade na educação do campo, quem mora na área rural quer frequentar a escola:
- Tem estabelecimentos sem banheiro, com paredes rachadas, sem material pedagógico. Mas, ainda assim, a população quer estudar. E há professores que, apesar dos problemas, fazem de tudo para dar aula.
Ednalva Cavalcanti, que hoje ensina 12 alunos, é assim, mas está desanimada, pois acha que a Escola Santa Rita, em Escada, está marcada para morrer: das três salas, duas estão fechadas.
- É triste ver o pessoal indo embora para dar lugar à cana - diz, informando que, em média, os alunos passam apenas três horas na escola, considerada uma das mais conservadas da área rural do município, pois tem alpendre, luz e água.
Entre 2007 e 2011, seis escolas municipais cerraram as portas em Escada, diz a secretária de Educação do município, Elizabeth Cavalcanti, explicando que a Tiradentes fechou por falta de alunos no Canto Escuro, onde O GLOBO computou, pelo menos, 20 moradias próximas:
- No engenho, só há quase adultos e adolescentes.
As três pesquisadoras ressaltam que a educação no campo é melhor nos assentamentos, por pressão e organização de movimentos sociais, como MST, que, recentemente, lançou a campanha "Fechar escola é crime".
O MEC informa que municípios, estados e DF recebem apoio técnico e financeiro por meio de várias ações e programas para educação do campo, onde estão quase 50% das escolas da educação básica do país, e diz que está elaborando um programa para implementar a Política de Educação do Campo. Destaca ainda que orienta para que a nucleação ocorra "quando realmente necessária", e dentro das diretrizes da área.


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quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012

Um professor pode ser substituído por uma máquina ?

http://revistaepoca.globo.com/Ciencia-e-tecnologia/noticia/2012/02/sugata-mitra-um-professor-pode-ser-substituido-por-uma-maquina.html


Sugata Mitra: "Um professor pode ser substituído por uma máquina"

Um dos maiores especialistas do mundo em tecnologias educacionais fala ao público da Campus Party 2012, em São Paulo, sobre sua experiência com crianças que aprendem sobre o mundo apenas em computadores, e ensinam umas às outras

Sugata Mitra, indiano radicado na Inglaterra, veio à Campus Party 2012, no Anhembi Parque, em São Paulo, para falar de um assunto tomado como "chato" por um público de jovens nerds e seus potentes computadores: Educação. O senhor gordinho, de bigode grisalho e algum bom humor acabou lotando as cadeiras de plástico do palco principal da feira para falar de uma experiência cativante com crianças indianas e computadores, e causou impacto ao afirmar que "professores podem ser substituídos por uma máquina". "E o que pode ser substituído por uma máquina deve ser substituído", disse, arrancando aplausos do público. A palestra ocorreu no início da noite desta terça-feira, dia 7. 
Mitra é pesquisador e professor de Tecnologia Educacional da Newcastle University, na Inglaterra, e professor visitante do Massachusetts Institute of Technology, o prestigiado MIT, no Estados Unidos. Sua principal pesquisa foi o mote da palestra, intitulada "O buraco na parede... e além". O título se refere à experiência de colocar um computador preso dentro de uma parede, com acesso à internet, em um povoado pobre da Índia, sua terra natal. 
"Entre 1999 e 2001, na Índia, havia muitas crianças sem acesso a computadores, e quase nenhum professor para ensinar informática", disse Mitra. Ele resolveu testar a reação das crianças ao aparelho sem a ajuda de professores, simplesmente colocando um no meio de uma favela indiana. Não havia ninguém para ajudar no uso, mas a máquina tinha monitoramento remoto. Estava equipada com teclado, mouse e o mecanismo de busca na web popular na época, o Altavista.
Crianças que não sabiam inglês estavam surfando na web, ensinando umas às outras"
SUGATA MITRA
O resultado dos dados de navegação foi surpreendente. "Crianças que não sabiam inglês estavam surfando na web, ensinando umas às outras", disse o professor. Ao repetir a mesma experiência em uma comunidade ainda mais isolada, o resultado de dois meses foi uma demanda técnica das crianças. "Eles disseram que precisavam de um processador mais rápido e um mouse melhor", afirma Sugata Mitra. 
Com os resultados impressionantes nas mãos, a equipe de Mitra conseguiu verba do Banco Mundial para prosseguir com a pesquisa, que foi replicada em outras cidades da Índia e da África do Sul. Além de dados, os computadores da nova fase também enviavam fotografias de quem estava usando a máquina e imagens da tela navegada, de dois em dois minutos. Para garantir que apenas crianças navegassem, o teclado e o mouse ficavam em uma caixa de madeira, com um buraco para caber apenas mãos bem pequeninas. 
Até 2004, segundo Mitra, 1 milhão de crianças aprenderam sozinhas a usar o computador, em grupo, ensinando umas às outras. E aprenderam o básico de inglês, para poder se comunicar com o mundo. "Em apenas 9 meses, as crianças chegavam no nível de secretárias que trabalham com o computador", disse. 

Outra evolução da pesquisa foi um teste arriscado, e o resultado, segundo Mitra, era analisar o fracasso. O 'problema' é que não houve fracasso. A proposta: Será que crianças na pré-adolescência entenderiam um texto que explica a biotecnologia na reprodução do DNA? No primeiro teste sobre o assunto, todos tiraram zero, como era de se esperar. Dois meses depois, a mesma coisa. O interessante é que ninguém, segundo Mitra, deixava de se interessar em tentar. Mais dois meses se passaram e o nível de acerto em um novo teste foi de 30%. Sugata Mitra queria 50%, o mesmo nível obtido por crianças das melhores escolas particulares de Nova Deli, capital da Índia. 
A partir de 2004, a pesquisa seguiu rumos ambiciosos. A demanda por pessoas que falam língua inglesa nos empregos indianos - principalmente em call centers - era, e é, grande na Índia. A ideia de Mitra foi introduzir no computador de uma turma específica um programa que transforma em texto as palavras ditas em inglês. "No começo, elas falavam e o computador não entendia. Disse que elas teriam que fazer com que o computador entendesse", afirmou. "Voltei 2 meses depois e cumprimentei uma criança: 'How are you?' ('Como está você?'). Ela respondeu 'Fantastic' ('Fantástico')", disse. Segundo Mitra, os estudantes tinham baixado uma versão online do Dicionário Oxford. Assim, buscavam a palavra, ouviam a pronúncia e repetiam para o programa instalado pelo pesquisador, que reproduzia a mesma palavra na tela. Era só conferir. "Um professor faria isso. Mas o professor (ele mesmo) foi embora, e só voltou dois meses depois". 
A estratégia para alcançar esse objetivo foi simples: Escolher uma aluna simplesmente para incentivar as crianças, dizendo coisas como "Fantástico! Na minha idade eu faria muito menos", mesmo que o resultado do 'aluno' em questão não fosse satisfatório. No terceiro teste, as crianças acertaram metade das questões, afirma Mitra. 
Atualmente, as pesquisas com crianças e computadores são aplicadas por Mitra em vários países, inclusive no Brasil. Na manhã antes da palestra, no dia 7 de fevereiro, o pesquisador visitou a Casa do Zezinho, um projeto social de educação para crianças de favelas da Zona Sul de São Paulo. A nova configuração do experimento é apresentar grandes questões às crianças e esperar pelo resultado das buscas em grupo. 
A questão apresentada às crianças de São Paulo foi "Por que nós sonhamos?". Com apenas um dia de pesquisas, a resposta foi simples, mas surpreendente: "Sonhos são causados pela mente, e Sigmund Freud desvendou seus significados. Mas estudos recentes contestam as conclusões dele", disse Mitra, reproduzindo a resposta dos alunos.
O emprego dos professores não seria ameaçado. Seria diferente."
SUGATA MITRA
Na polêmica teoria de Sugata Mitra, "o futuro da educação está na auto-educação", e o papel do professor do futuro seria o de apresentar questões que instigam a curiosidade das crianças, principalmente crianças com menos de 13 anos, mais abertas ao conhecimento e menos ligadas a questões como classes sociais. "A reação de crianças abaixo dos treze anos é exatamente igual em qualquer lugar do mundo", afirma o pesquisador. "O emprego dos professores não seria ameaçado. Seria diferente", afirmou.
Como exemplo do sucesso de formular questões interessantes às crianças, ele usou uma pergunta feita para um grupo da Itália: "Como um iPad (tablet da Apple) sabe onde ele está?". O resultado da pesquisa dos alunos foi simples: três satélites localizam o iPad, e assim é possível identificar seu lugar no espaço. Segundo Mitra, ensinar as bases da trigonometria, que explicam de outra forma a questão do iPad, não instiga a curiosidade infantil. "Estudar os ângulos de um triângulo dá sono", diz. 
Como um modelo de ensino tão polêmico teria lugar nas escolas? Segundo Mitra, a mudança precisa vir de baixo para cima. "Basta procurar as empresas de tecnologia e investir na banda larga nas escolas, e tudo vai acontecer naturalmente", diz Mitra, que já procurou o governo da Inglaterra para testar seu modelo, sempre sem sucesso. RAFAEL PEREIRA